A crise instalada em torno do chefe da Petrobras, Jean Paul Prates, entrou pelo segundo dia sem uma solução definitiva do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, que voltou na tarde de sexta-feira a Brasília depois de cumprir agenda no Nordeste. Auxiliares do presidente, porém, consideram a situação insustentável. Enquanto isso, Prates arma sua defesa para se manter no cargo.
Além dos conflitos com os ministros de Minas e Energia, Alexandre Silveira, e da Casa Civil, Rui Costa, o estilo de gestão de Prates também tem desagrado o presidente Lula, de acordo com auxiliares próximos do petista.
A troca no comando da companhia é tratada abertamente por ministros do governo, que ressaltam, porém, que a saída de Prates ainda não está sacramentada. A avaliação no Palácio do Planalto é que Prates mergulhou muito no que chamam de lógica corporativa da empresa petrolífera.
Isso gerou um conflito conceitual entre o que o presidente da República defende para a estatal e o modelo que está sendo implantado pelo CEO da companhia. Pessoas próximas a Lula entendem que isso pode ser determinante para uma troca de comando da empresa.
Infraestrutura no foco
Lula defende ampliar os investimentos em infraestrutura, como parques de refino e na indústria naval, e critica o que considera uma lógica de focar em apenas resultados financeiros positivos para a empresa. Outra área em que ele defende aportes é a fabricação de fertilizantes.
Para Lula, grande parte do lucro da Petrobras deve ser destinado a investimentos. O presidente vê a maior empresa brasileira como um trunfo para o seu governo alavancar o crescimento da economia.
Desde seus primeiros governos, Lula costuma dizer que a Petrobras é um patrimônio do povo brasileiro e que a estatal não deve ter como preocupação principal gerar dividendos para seus acionistas. Esse discurso tem sido repetido por Silveira.
Prates pediu uma reunião para Lula arbitrar o tiroteio público em torno de seu nome, e esse encontro é aguardado para segunda-feira. Ele não participou da reunião do Conselho de Administração da Petrobras na sexta-feira e argumentou a auxiliares que o encontro não teve nada demais — no colegiado, os indicados do governo, que são maioria, foram escolhidos por Silveira e Costa. Segundo um participante da reunião do conselho, o clima foi de “baixo astral”.
Atualmente, o nome mais forte para substituir Prates é o do presidente do BNDES, Aloizio Mercadante. Os dois tiveram uma conversa esta semana, em que Mercadante comunicou a Prates ter sido sondado por auxiliares de Lula para o cargo. Ele vem dizendo, inclusive, que não concorda com o massacre público que o correligionário está sofrendo.
Petista histórico e com relação de décadas com Lula, Mercadante demonstrou resistência em trocar a direção do banco pelo comando da Petrobras, mas pessoas próximas a ele acham improvável que o ex-ministro não assuma a estatal diante de um eventual convite do presidente — que ainda não foi feito. Um “plano B” dos que defendem a saída de Prates é nomear um interino ou indicar Magda Chateaubriand, ex-diretora da Agência Nacional do Petróleo (ANP).
Na sexta-feira, aliados de Prates passaram a articular uma solução intermediária, que prevê colocar Mercadante na presidência do Conselho de Administração da estatal. Porém, a interlocutores, ambos trataram de dizer que não veem com bons olhos a proposta. Silveira quer manter seu indicado no conselho, Pietro Mendes. Mercadante não gostaria de se ver numa posição de “tutelar” a gestão de Prates.
Transição energética
O grupo de Prates também tratou de circular versão pela qual o atual infortúnio do petista seria resultado de uma tática diversionista de Silveira. Na visão de aliados do presidente da Petrobras, o desgaste só acontece porque o ministro busca uma forma de desviar atenção para supostos erros de sua gestão à frente da pasta, como a crise da Enel em São Paulo.
Auxiliares do chefe da estatal também argumentam que a gestão dele é positiva, destacando mudanças promovidas na política de preços dos combustíveis, que teriam atendido aos anseios de Lula sem maiores impactos nas ações.
No caso do pagamento de dividendos extraordinários da companhia, em março — último conflito entre o Planalto e a direção da estatal —, Prates defendeu que metade da quantia de R$ 43,9 bilhões deveria ser repassada aos acionistas. Silveira e Costa eram favoráveis que os recursos ficassem no caixa da estatal.
Auxiliares de Prates argumentam que a gestão dele estava na direção correta e que o governo decidiu distribuir os dividendos extras da Petrobras nos mesmos moldes sugeridos pelo presidente da estatal.
Essa questão, porém, teria relação direta com o impacto fiscal. A distribuição de 100% dos dividendos levaria a um reforço de R$ 12 bilhões no caixa da União, mais que o suficiente para cobrir o buraco de R$ 10 bilhões gerado pela redução de impostos para prefeituras após decisão do presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), sobre a desoneração da folha.
Outro ponto é o futuro da Petrobras. Prates enfrentava um embate com conselheiros ligados a Silveira na sua tentativa de transição energética. O ministro defende foco na exploração de petróleo e gás.
A reunião de sexta-feira do Conselho de Administração não discutiu uma possível mudança na distribuição dos dividendos, nem tratou de temas relacionados à mudança no comando da empresa.
Conselheiros e diretores da Petrobras temem que a disputa leve a uma paralisia na tomada de decisões na companhia e, principalmente, a uma maior ingerência política no dia a dia da empresa. A situação preocupa o mercado.
Perda de oportunidade
Para Vitor Sousa, analista da corretora e gestora Genial Investimentos, o aumento da intervenção do governo em empresas abertas — estatais ou não, como Eletrobras e Vale — é um “balde de água fria” para investidores em ações. A intervenção do governo, diz, mexe no que estava bom:
— É uma Bolsa barata, com as empresas até entregando um operacional bom e com um processo de corte de juros. Era para estar todo mundo indo para lá, mas não observamos isso.
Lívio Ribeiro, sócio da consultoria BRCG, afirma que uma metodologia desenvolvida pela equipe de consultores para analisar a taxa de câmbio, desagregando os efeitos entre externos e domésticos, mostra que os componentes internos pioraram junto com os de fora:
— O Brasil pode perder uma oportunidade, quando o mundo está favorável e o país faz besteira, ou, como no momento atual, quando o mundo não está favorável, o Brasil está tornando a vida mais difícil.
G1