Luiz Fernando
Imagine a seguinte cena. Você está em sua casa, sua cidade e de repente chega a notícia de que um grande e poderoso exército está vindo em sua direção, disposto a tomar o lugar. Homens, mulheres e crianças não serão poupados, tudo virará cinzas ou despojo de guerra. Impensável nos dias de hoje, não é mesmo?
Mas se retrocedermos no tempo, era exatamente o que acontecia quando impérios como o da República Romana decidiu expandir suas fronteiras a partir do século IV aC, na região central da Península Itálica e depois para outras regiões do mundo.
Para se ter uma ideia em seu apogeu, durante o século II dC, o Império Romano alcançou cerca de 5 milhões de quilômetros quadrados, abrangendo vastas extensões da Europa, norte da África e Oriente Médio.
Seus generais adotavam sempre a mesma estratégia. Chegavam, invadiam e tomavam conta de tudo.
Homens livres, quando não eram mortos, tornavam-se escravos e o Império ia se fortalecendo cada vez mais.
Mas havia uma prática que foi adotada por volta dos séculos I e II aC até o século IV dC que era comum a todos os generais. Uma prática que ao meu ver deveria ter se perpetuado em todos os tempos e povos, mas ela se perdeu com o declínio do Império Romano e a transição de Roma para o cristianismo.
A prática era simples, mas levada a sério entre os generais romanos. Sempre que venciam uma batalha, durante a comemoração do triunfo, um escravo ou assistente do general ficava sussurrando em seu ouvido a frase “Memento Mori”, uma expressão em latim que significa “Lembre-se de que você vai morrer”.
O objetivo desse importante ritual era lembrar o general vitorioso que independente de sua conquista, ele deveria manter os pés no chão, não deixar o ego tomar conta de sua vida, lembrando-o de sua mortalidade e o livrando do orgulho e da arrogância.
“Memento Mori” era um convite à humildade e a reflexão sobre a vida, evitando assim que o líder se distanciasse de seu propósito.
Uma afirmação poderosa de que apesar de sua bravura, força, estratégia e determinação, um dia o mesmo seria encontrado pela morte, então, viver plenamente e com humildade seria o caminho saudável para o mesmo.
Imagine quantas conquistas poderiam ser celebradas com essa prática. Toneladas de arrogância, empáfia e perda de tempo ficariam pelo caminho e poderíamos de fato viver o nosso propósito.
Desta forma, seja a conquista de uma pequena aldeia ou uma grande cidade como Jerusalém, que foi tomada entre os anos de 66 e 73 dC, era comemorada da mesma maneira. Ninguém era mais ou menos que ninguém. Existia um propósito, uma meta que ao ser atingida terminava sempre com alguém sussurrando no ouvido do general, “Memento Mori”.
Trazendo agora para a nossa realidade, imaginemos quantas vezes seria de bom alvitre que tivéssemos alguém a sussurrar em nossos ouvidos essa afirmação tão simples (frase curta) e singela (sussurrada).
Conseguiu uma promoção no trabalho, Memento Mori. Comprou um carro novo, Memento Mori. O celular de último tipo chegou, Memento Mori. Foi eleito para um cargo eletivo, Memento Mori.
Imagine quantas conquistas poderiam ser celebradas com essa prática. Toneladas de arrogância, empáfia e perda de tempo ficariam pelo caminho e poderíamos de fato viver o nosso propósito.
Talvez esse seja um caminho para nós que vivemos num mundo cada vez mais individualizado e compartimentado pela tecnologia que se expande sem precedentes.
Como diz um amigo meu, o mundo está cheio de palito de fósforo se achando neon.
Entre o Ter o Ser, muitos não pensam duas vezes em escolher o Ter.
A empatia em muito breve vai se tornar demodê, afinal rir-se de tudo e de todos se tornou comum, a dor do outro já não importa. Telas e dedos frenéticos ocuparam o espaço do abraço e da conversa franca, o olho no olho está raro.
E aqui neste ponto cabe mais uma reflexão, com a chegada da IA (Inteligência Artificial) em nossas vidas, o que mais perderemos? Para onde iremos caminhar?
Nossa salvação enquanto humanidade pode sim estar em cerimônias e cultos do passado.
Bença mãe, bença pai, bença vó, bença tio, essa é mais uma tradição importantíssima que está se perdendo. Práticas que não estão em nenhuma tela ou teclado devorador de almas, mas estão, ou pelo menos deveriam estar, em nosso coração e nossa mente.
Um movimento de transformação começa com alguém dando o primeiro passo ou nesse caso o primeiro sussurro.
Memento Mori para mim e para você.
Vamos celebrar nossas conquistas nos lembrando sempre de quem somos e de quem seremos, e assim vamos reforçar o nosso propósito de vida. Menos arrogância e mais empatia.
Mas daí você pode argumentar: “E quem vai sussurrar tal expressão em meu ouvido”.
Tenho uma proposta simples e extremamente eficaz. Vá para frente do espelho, olhe nos seus olhos e fale pra você mesmo, Memento Mori. Faça isso quantas vezes forem necessárias, até você se conscientizar da finitude da vida e que tudo vai passar.
Dores, amores, conquistas, tudo vai passar. Ficarão os seus feitos, os seus jeitos e o amor que você plantou no coração de cada ser que cruzou o seu caminho.
Fora isso, tudo é ilusão.
O celular da moda deixa de ser objeto de desejo quando o 16 é lançado. O carro elétrico deixa de ser novidade quando a próxima tecnologia é apresentada. Tudo passa, sempre existirá uma nova conquista, uma nova batalha interna a ser vencida. Seja o general de si mesmo e o servo a te lembrar disso.
E já que não temos como viver livres da tecnologia escravizante, aproveite e compartilhe esse escrito com quem você ama, só assim quando você mandar uma mensagem de Memento Mori para ele ou para ela, a pessoa vai entender o recado e talvez, sim talvez, deixar a humildade preencher seu coração e sua mente.
Memento Mori pra todos nós.
Luiz Fernando é jornalista em Cuiabá, palestrante, terapeuta holístico e criador do método CURE que auxilia no tratamento para a bipolaridade. @luizfernandofernandesmt (FALE COM O LUIZ)