Dia do rádio: Fim do AM e falta de diversidade no FM em Mato Grosso

VINICIUS ANTÔNIO

Há muito que se comemorar no dia 25 de setembro e durante todo o ano pela evolução e crescimento do rádio. O veículo continua com alta penetração na sociedade e se mostra vivo, apesar de suas inúmeras notas de falecimento fakes. Para alguém que vive em função desse veículo desde criança, surfando nas ondas sonoras e falando na latinha, creio que o rádio é o meio de comunicação em massa que mais se adaptou às novas mídias. Olha lá o rádio produzindo memes e conteúdo para o Instagram, notícias e publicações para o Facebook, vídeos, podcasts e tantos materiais para o YouTube. Essa possibilidade de se reinventar, talvez, ou melhor, com certeza, faz com que permaneça tão íntimo de quem o trata como membro da família e o faz companhia diária. Embora o rádio de mesa não tenha virado um mero suvenir, a possibilidade de entregar e ouvir o que se transmite em inúmeras plataformas, faz com que o rádio avance e se molde. Afinal, quantas emissoras com câmeras em seu estúdio, obstante daquela imagem fixa em uma só cena, que agora se tornou em cortes e destaques para quem fala, para o clipe da música que está no ar. Enfim, a convergência chegou e o rádio tomou posse daquilo que anunciadamente viria como afiada punhalada certeira.

Em 2016, na administração Dilma Rousseff, o Brasil iniciava a tomada de um novo rumo nas comunicações, quando o decreto presidencial nº 8.139, autorizava a migração do AM (Amplitude Modulada) para o FM (Frequência Modulada). A partir deste fato, comunicadores se dividiram em suas opiniões, embora, em sua maioria, classificaram como louvável a opção do Ministério das Comunicações daquele governo. Destacam-se aqui, nessa linha de pensamento, os donos das AM’s, que naquela altura sofriam com os altos custos de manutenção da operação do sistema em ondas médias. A principal queixa era o preço da energia e um modelo de transmissão mais suscetível a interferências dado o avanço das transmissões de celulares, internet e, até mesmo, rede elétrica. Ligue o Corcel 2 perto de um rádio receptor AM e ouça o ruído na transmissão.

“Desde a chegada oficial da TV, exatamente em setembro de 1950, o rádio enfrenta previsões ‘futurísticas’ que, inclusive, detalhavam o fim do serviço desse instrumento de comunicação de massa. O tempo passou e o rádio continua absoluto e, certamente, não vai ser a total migração de AM, da amplitude modulada, para FM, a frequência modulada, que provocará o encerramento. O rádio não vai acabar. Toda mudança, independente da situação, dentro do contexto lógico, provoca alterações vantajosas como também não tão interessantes. E entre as vantagens dessa mudança estão melhorias na qualidade do serviço técnico, dentro de um raio de menor alcance, e redução de custos paras as emissoras. No entanto, é preciso, nesse cenário de transição de formato, como muitas emissoras já estão praticando, estabelecer novo tempo na produção de conteúdos, dentro do mundo de convergência midiática, que permitam a permanência e também o engajamento de mais ouvintes. E tudo isso sem que o rádio perca as características de instantaneidade e imediatismo da radiodifusão”, comenta o professor universitário e Diretor de Imprensa e Novas Mídias do Tribunal de Justiça de Mato Grosso, Álvaro Marinho.

Este ano de 2023 é o último em que AM’s locais podem ficar em operação no país. O prazo para o funcionamento vai até 31 de dezembro. E, a partir daí um outro ponto de vista. Com a obrigatoriedade do desligamento, estudiosos do rádio afirmam que o Brasil cria uma infinidade de regiões sem comunicação, ou os chamados “desertos de informações”. Há nós, cá em Mato Grosso, vale lembrar o Pantanal, onde existe uma dificuldade imensa para a chegada de novas tecnologias, em especial a internet, e nem mesmo a frequência modulada, ainda que com enorme potência de transmissão, consegue propagação. Ali, o AM se faz mais que necessário e a discussão, mesmo após seu ‘fim’, é que nessas regiões, como Pantanal e Amazônia, o modelo deve ser mantido.

Ainda debatendo sobre o fim do AM, mas sem entrar no mérito de seu indiscutível maior alcance, é preciso se falar sobre aquilo que é título deste artigo e questionar o chamado ‘mais do mesmo’. Não há de se citar aqui as rádios que migraram no interior, já que, segundo os pesquisadores do rádio, a segmentação de emissoras deve ser usada apenas em cidades com mais de 200 mil habitantes, e o fato faz com que essas pequenas rádios que migraram a se verem obrigadas a seguir o padrão popular.

Mas, tratemos do rádio cuiabano, pois, na capital, foram quatro migrantes, a antiga CBN, que agora transmite o sinal da rádio Vila Real, a Rádio Cultura trocou de faixa e continua com o mesmo nome, a Rádio Difusora Bom Jesus, que após quase 60 anos no ar, fez uma pequena alteração no nome ao migrar e agora opera no FM como Bom Jesus. E claro, a mais antiga emissora de rádio mato-grossense, A Voz do Oeste, que se tornou Conti FM e agora está, em caráter experimental, como FM O Dia, franquia que reproduz moldes de uma programação da capital do Estado do Rio de Janeiro. Na região metropolitana de Cuiabá, de Várzea Grande também migrou a antiga Rádio Industrial, que hoje retransmite a Rádio Massa FM.

Com a mudança de faixa, o número de rádios populares aumentou exorbitantemente, fazendo com que as mesmas músicas, o mesmo estilo de locução, as mesmas ideias de promoções, com nomes diferentes, dominassem o rádio cuiabano. O fato é tão verídico, que as pesquisas de opinião dos ouvintes mostram emissoras dando traço e sempre a mesma rádio em primeiro lugar, já que para ouvir o mesmo estilo, é melhor nem mudar o aparelho de estação.

“Eu acho que o maior problema é que o pessoal das AMs não se preparou para fazer uma mudança de linguagem. Muitas rádios, não só no mercado cuiabano, mas no Brasil, só transferiram a sua rádio AM para uma frequência modulada, não mudando muita coisa na sua linguagem, na sua maneira de conduzir, pensando que talvez toda a audiência que eles tinham no AM fosse migrar para o FM. É mais interessante que os comunicadores, os diretores de rádio hoje, façam uma reflexão mais profunda das tecnologias que estão à disposição para que possam ser feitos produtos especiais, específicos para nichos que não estão sendo atingidos. Sair do ‘mais do mesmo’ é uma reflexão que cada emissora tem que fazer e com seriedade. Misturar música com informação, não aquela informação pesada, mas uma informação leve. O rádio precisa ser leve. Os veículos de televisão já estão ocupando o papel da notícia pesada o tempo todo e é o papel deles. Modelos que dão certo em São Paulo, Minas, Paraná talvez não deem certo aqui. Sair do ‘mais do mesmo’ é uma é uma reflexão profunda e importante que cada emissora precisa fazer com todos da equipe. A gente só consegue entender e encontrar o melhor caminho reunindo todo mundo e fazendo reflexão”, é o pensamento de Yankee Ferreira, locutor publicitário e diretor de rádio.

O jornalista e produtor de rádio Jurandir Antônio, com vasta experiência no meio, aponta que a tecnologia não só melhorou o jeito de ouvir rádio, mas possibilitou uma facilidade para quem transmite música, notícias, prestação de serviço. “O Rádio foi o veículo de comunicação que mais ganhou com o avanço das novas tecnologias. A internet e o celular turbinaram as possibilidades do fazer rádio. O telefone celular aposentou os antigos equipamentos dos carros de reportagens, deu mobilidade aos repórteres e facilitou encontrar as fontes para entrevistas em qualquer lugar do mundo, simplificou a interação com o ouvinte, além de funcionar também com receptor das emissoras de rádio”.

Com a rede mundial de computadores, qualquer emissora se tornou de alcance internacional, deixando de lado os imensos parques de transmissão para que a onda sonora atingisse um maior território. “A internet possibilitou alcance planetário as emissoras de rádio que estão na rede e diversificou as formar de “escutar” rádio. A internet possibilitou ainda o surgimento das web rádios, que apresentaram um crescimento expressivo nos últimos anos, oferecendo as pessoas a possibilidade de escolher uma programação mais próxima do seu gosto”, defende Jurandir.

A partir dessa análise quanto aos avanços alcançados, Jurandir pontua que o rádio precisa sair da mesmice e reaver o seu lugar, principalmente no combate às fake News. “Considero que a internet, o celular e a migração do rádio AM para o FM inauguraram uma nova era no rádio. Mas, as inovações tecnológicas não refletiram no resultado final da programação da maioria das emissoras. Está tudo muito parecido. Pouca criatividade e muita “mesmice”. No mar de fake News que domina a terra sem lei das mídias sociais, o rádio pode ser um contraponto no combate a desinformação. O rádio precisa recuperar o seu papel social como difusor de cultura, prestação de serviços, educação informação e cidadania”, conclui o jornalista.

Comemorar o crescimento e a adaptação constante do rádio, não quer dizer deixar de elencar pontos que precisam de atenção e melhoria. Afinal, não há quem esteja perfeito, mas sim em aperfeiçoamento, nem mesmo esse veículo tão incrível, por quem nutrimos um profundo amor e dedicamos grande parte de nossos dias.

VINÍCIUS ANTÔNIO – é jornalista.

Os artigos assinados são de responsabilidade dos autores e não refletem necessariamente a opinião do site Cuiabá Notícias.

Acesse o grupo do Cuiabá Notícias no WhatsApp e receba notícias atualizadas

  (CLIQUE AQUI)

“Ao comentar você declara ter ciência dos termos de uso de dados e privacidade
do Portal e assume integralmente a responsabilidade pelo teor do
comentário. “

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *