Por: AMANDA PAIM
O Dia Mundial de Conscientização do Autismo é celebrado no dia 2 de abril. A data, estabelecida em 2007, tem como objetivo difundir informações para a sociedade e desmistificar o preconceito e discriminação sobre quem tem esse diagnóstico.
O transtorno do espectro autista (TEA) é uma condição de saúde caracterizada por déficit na comunicação social (socialização e comunicação verbal/não verbal) e comportamento. Existem muitos subtipos do transtorno, por isso é caracterizado como ‘’espectro’’, devido aos vários níveis de suporte.
A identificação do TEA pode ser feita a partir dos 18 meses, de acordo com a Associação de Amigos do Autista, e o encaminhamento para intervenções comportamentais e apoio educacional deve ser o mais precoce possível, a fim de levar a melhores resultados a longo prazo.
O Cuiabá Notícias conversou com algumas mães de crianças autistas que relataram os desafios do dia a dia e ressaltaram a importância da conscientização e sensibilização da sociedade sobre o assunto.
Kelly Viegas – mãe da Analice
A presidente da Associação de Amigos do Autista de MT (AMA) Kelly Viegas tem 39 anos é mãe de 3 filhos, Vinícius de 20 anos, Davi de 6 e Analice de 11 anos, que é autista.
Kelly contou que percebeu os primeiros sinais na filha Analice aos 2 anos. Ela apresentava dificuldades na fala e tinha comportamento apático, momento em que decidiu levá-la a um profissional da saúde.
“Eu levei ela ao pediatra, depois levei ao neurologista infantil, em que fez todos os exames e não deu alteração nenhuma. Simplesmente, me mandou colocá-la numa creche que resolvia a situação’’, contou.
Não concordando com o resultado, Kelly levou Analice a uma segunda avaliação, dessa vez procurou um psiquiatra, que diagnosticou a menina com transtorno de espectro autista grau leve a moderado. Ela ainda foi encaminhada para assistência com outros profissionais como psicóloga, fonoaudióloga e terapeuta ocupacional.
Atualmente com 11 anos, Analice já avançou em seu desenvolvimento e consegue fazer muitas atividades por conta própria. Para Kelly, a intervenção precoce fez toda a diferença para o progresso do quadro da filha.
‘’Ela já faz o próprio leite, ela vai ao banheiro sozinha, ela toma banho sozinha, então ela teve uma grande evolução desde quando ela começou o tratamento ainda pequena’’, contou.
Rosane Maria Kempner – psicopedagoga e mãe do Guilherme
A psicopedagoga Rosane Maria Kempner, 44 anos, se considera uma mãe ‘’atípica’’. Mãe de Guilherme N. Kempner, de 5 anos, com TEA nível 1 de suporte e altas habilidades. Ela conta que o desenvolvimento do filho aconteceu normalmente até os dois anos de idade. Então, começaram os padrões de comportamentos restritos e repetitivos, e também a falta de contato visual. Rosane, inicialmente, acreditou que Guilherme poderia ter algum problema auditivo, o que foi descartado por exames feitos por um otorrino.
‘’Os resultados deram normais, e nós fomos encaminhadas a fazer uma avaliação com a fono. Mas, eu já tinha desconfiado de alguns sintomas atípicos que ele estava apresentando’’, disse.
Outras características do filho, como hiperfoco e inteligência aguçada para a idade, indicaram que a psicopedagoga deveria procurar outros médicos a fim de indicarem enfim um diagnóstico. Isso só aconteceu após a ida a uma neuropediatra, que detectou a condição do menino.
A descoberta fez com que a psicopedagoga, que atua há 26 anos na Educação, buscasse especializações na área do autismo. Ela cursou análise de comportamento aplicada (ABA), que é uma ciência que faz parte das intervenções aplicadas no TEA. Além disso, atualmente, ela está cursando Neurociência e Neuropsicopedagogia, e ajuda pais e profissionais da educação com orientações e palestras.
Guilherme é o xodó da família, e Rosane conta com um grande apoio de todos no desenvolvimento dele. Ela descreve o caçula como ‘’uma criança amorosa, espontânea, que trouxe muita alegria pra gente’’.
Sobre os desafios que as famílias com pessoas com TEA enfrentam na sociedade, Rosane evidencia os estigmas do transtorno e também a negligência do poder público a respeito do cumprimento das leis que versam sobre o tema.
“O capacitismo, o preconceito e a falta de informação. O não cumprimento das leis que garantem os direitos dos autistas. Nós lutamos, corremos atrás, vamos fazer com que os direitos deles sejam cumpridos’’, afirma.
Quanto ao futuro que espera para o filho, a psicopedagoga sonha em uma sociedade mais esclarecida e empática. ‘’[…] Que ele possa ter um futuro tranquilo, porque nós sonhamos com um futuro em que as pessoas possam enxergar o autismo e as demais deficiências como parte desse mundo e não um mundo à parte’’.
Maysa Leão – vereadora e mãe do João Lucas
A vereadora Maysa Leão, de 42 anos, é mãe de um adolescente de 13 anos, com espectro autista nível 1. Para a parlamentar, uma das principais dificuldades na criação do filho é o fato dele sofrer preconceito da sociedade, e que ele já foi vítima de bullying na escola e excluído pelos colegas.
“Muito pequenininho, com cinco anos de idade, ele sofreu bullying na escola, ele sofreu exclusões, sofreu olhares, principalmente quando as pessoas vão vendo mais de perto, vão vendo as diferenças dele, e as pessoas não sabem lidar com as diferenças’’, explica.
A legisladora municipal lembra que existem políticas públicas, como a Lei Berenice Piana de 2012, que institui a Política Nacional de Proteção dos Direitos da Pessoa com Transtorno do Espectro Autista. Porém, ela cita que, na prática, os direitos não são assegurados devido à falta de empatia dos governantes, que acreditam que as medidas vão gerar um custo alto.
Para Maysa, o conhecimento científico e informações sobre o tema são fundamentais para a inclusão. Somente assim, serão consolidadas e executadas as políticas públicas voltadas a essa parcela da população.
“O que precisa de fato na sociedade é conhecimento verdadeiro, científico. Entender que o autismo se divide em nível 1, 2 e 3 de suporte. Que nenhuma criança autista é igual a outra, que nem todas as crianças autistas são pequenos gênios, e mesmo aqueles que são, eles têm dificuldades basais como amarrar o cadarço de um sapato, de conviver em sociedade, de fazer amigos, de se alimentar’’, disse.
“Que a sociedade tenha nas escolas, nos locais de educação, de formação de profissionais de saúde, disponíveis para todas as famílias e informações. Informação salva e a inclusão é uma decisão, que a nossa sociedade decida incluir’’, finalizou a vereadora.
Laíse Schwarz – Psicóloga e especialista em análise de comportamento
A psicóloga e analista de comportamento aplicada ao transtorno de espectro autista e deficiência intelectual, Laíse Schwarz, de 32 anos, contou à equipe do Cuiabá Notícias sobre os procedimentos que determinam o diagnóstico do transtorno de espectro autista.
“O diagnóstico do autismo é clínico, ou seja, realizado por meio de observações diretas e entrevistas. O recomendado é que uma equipe multidisciplinar avalie, considerando de forma particular as necessidades’’.
Laíse afirma que quanto mais cedo o diagnóstico e realização de intervenções cientificamente comprovadas, maiores são as chances de qualidade de vida para o autista e seus familiares.
A falta de diagnóstico e não estimulação no desenvolvimento das carências que a condição traz, segundo a psicóloga, podem acarretar em regressões comportamentais, falta de comunicação funcional e habilidades sociais, causando sofrimento na pessoa com autismo e as pessoas ao redor dela.
Para a profissional, é fundamental o esclarecimento da população sobre o assunto com informações que coloquem o tema em destaque, visando a conscientização da sociedade. Com isso, o atendimento às pessoas com autismo poderá ser feito de forma humanizada e sem preconceitos .
“A sociedade precisa estar preparada para atender as necessidades da pessoa com autismo, de forma a incluir e diminuir a discriminação. Colocar o tema em evidência é essencial para a conscientização e promoção de empatia’’, pontuou.