O Ministério Público Federal (MPF) e o Ministério Público do Estado de Mato Grosso (MPMT) moveram uma ação civil pública, com pedido de liminar, para a suspensão imediata das obras na rodovia MT-251, no trecho conhecido como “Portão do Inferno”, dentro do Parque Nacional da Chapada dos Guimarães. A ação aponta diversas irregularidades no licenciamento ambiental e alerta para o risco de alteração irreversível da paisagem e da topografia do local, além do aumento do risco de deslizamentos durante e após a execução das obras.
No mérito da ação, o MPF e o MPMT pedem a nulidade do processo de licenciamento ambiental em razão de várias irregularidades, como a falta de motivação para a aplicação do licenciamento simplificado, a classificação indevida de risco das obras de retaludamento e a nulidade da Autorização para Licenciamento Ambiental, entre outros pontos. O retaludamento é um processo de terraplanagem que envolve cortes ou aterros em terrenos inclinados, como encostas, com o objetivo de estabilizá-los e evitar deslizamentos.
Os MPs solicitam ainda que a Justiça Federal declare a nulidade da escolha do projeto de retaludamento da rocha, feito pelo Estado de Mato Grosso, devido à ausência de critérios de razoabilidade e proporcionalidade e à inexistência das vantagens apresentadas pela Secretaria de Estado de Infraestrutura e Logística (Sinfra/MT).
A procuradora da República Marianne Cury Paiva e o promotor de Justiça Leandro Volochko, autores da ação, pedem também a realização de estudos mais detalhados que considerem os aspectos ambientais, geológicos, cênicos, sociais e econômicos do Portão do Inferno, além de garantir a participação da população na tomada de decisão, com critérios e metodologias claras para a escolha da melhor intervenção na região.
São réus na ação o Estado de Mato Grosso, o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama), o Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio) e a empresa Lotufo Engenharia e Construções Ltda.
ENTENDA O CASO
Antes de ajuizar a ação, os autores realizaram duas reuniões com o Governo do Estado de Mato Grosso em busca de um acordo, nos dias 8 e 14 deste mês. No entanto, não houve êxito, resultando na judicialização do caso. Cabe destacar que a população de Chapada dos Guimarães, uma das mais afetadas pelas obras, manifestou-se contrária por meio de um abaixo-assinado virtual, que até a data da ação já havia reunido 16.785 assinaturas contra o retaludamento da encosta do Portão do Inferno.
O MPF acompanha o caso desde dezembro de 2023, por meio do Inquérito Civil (IC) nº 1.20.000.001301/2023-15, e o MPMT desde o mesmo mês, por meio do IC nº 000968-028/2023. O MPF identificou graves irregularidades no processo de licenciamento ambiental e, em 7 de agosto de 2024, emitiu a Recomendação nº 25/2024 ao Ibama, solicitando a correção de várias omissões no processo.
Entre os pontos destacados, o MPF pediu ao Ibama que explicasse a base legal utilizada para emitir a licença das obras e justificasse o uso do Licenciamento Ambiental Simplificado (LAS). Foi questionado, ainda, se o estado de emergência decretado pelo governo estadual após os deslizamentos ocorridos no local justificava essa escolha. A resposta do Ibama evidenciou a nulidade do licenciamento, ao constatar que a fundamentação apresentada era equivocada e contraditória.
Em resposta ao Ibama, em junho deste ano, a Sinfra apresentou estudos que avaliaram mais de dez alternativas de projeto, sendo que apenas quatro se mostraram viáveis: retaludamento, falso túnel, túnel e retificação do traçado. Segundo a Secretaria, o retaludamento foi escolhido por apresentar o melhor desempenho em custo, impacto e prazo, embora o Ibama já tivesse dúvidas sobre a adequação dessa alternativa em relação às demais.
Outra irregularidade apontada foi a ausência de consulta prévia ao Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) sobre os impactos das obras de retaludamento na terra quilombola “Lagoinha de Baixo”, situada dentro do Parque Nacional da Chapada dos Guimarães.
Diante disso, a ação pede que a Justiça determine ao Ibama e ao ICMBio que, no novo processo de licenciamento ambiental, analisem todas as alternativas tecnológicas apresentadas pela Sinfra, para verificar se a solução escolhida é a mais adequada para o caso.