O STF e o crime tributário

Victor Humberto Maizman

De acordo com a legislação penal em vigor, a ausência do pagamento de tributos resulta na ocorrência de crime contra a ordem tributária. Porém, em face de graves dificuldades financeiras, os dirigentes das empresas vieram a se deparar com dilemas acerca de quais despesas e dívidas escolheriam por adimplir, considerando inclusive o risco de impossibilidade de manutenção da atividade empresarial e até mesmo de não conseguir pagar os salários dos funcionários contratados, havendo por vezes, a decisão pelo não cumprimento de algumas obrigações tributárias em razão de tais dificuldades.

Em razão deste aspecto de ordem financeira, os Tribunais vem adotando a tese defensiva de exclusão da configuração de crimes tributários nos casos de graves dificuldades financeiras da empresa, desde que reste devidamente comprovado que o não recolhimento do tributo se deu em um contexto de crise grave o suficiente para não haver outra alternativa que não implicasse na impossibilidade do pagamento de funcionários e pelo fato de que não houve fraude, mas apenas o não recolhimento dos tributos devidos.

No mesmo sentido, o Supremo Tribunal Federal decidiu que se a evasão tributária for o único meio de que dispõe o agente para pagar os salários dos empregados, entende-se que não lhe seria exigível a criminalização de outra conduta, pois esta alternativa acarretaria um resultado socialmente mais danoso.

No entanto, a discussão gira em torno da possibilidade de aplicação da referida tese nos casos em que ocorreu não apenas o mero não recolhimento do tributo devido, mas também a efetiva sonegação. Por certo, o STF entendeu por restringir a aplicação do entendimento, considerando que, para que seja afastado o delito fiscal, haveria uma exigência de boa-fé, o que seria incompatível com a fraude.

Aliás, é notório que a legislação tributária brasileira é sabidamente complexa, fato que gera inclusive dúvidas da própria administração tributária quanto à sua interpretação. Assim, de acordo com o entendimento jurisprudencial não se pode presumir que o contribuinte cometeu fraude fiscal, sem contudo, comprovar que houve a intenção deliberada de sonegar.

Não por isso, é princípio geral de direito que a fraude não se presume, deve ser comprovada. Enfim, impor ao contribuinte que agiu de boa-fé os efeitos de um processo criminal resulta no inequívoco senso de injustiça, até porque o devedor terá que em algum momento adimplir a respectiva pendência fiscal com seu próprio patrimônio.

Victor Humberto Maizman – é Advogado e Consultor Jurídico Tributário.

Os artigos assinados são de responsabilidade dos autores e não refletem necessariamente a opinião do site de notícias Cuiabá Notícias.

 

Acesse o grupo do Cuiabá Notícias no WhatsApp e receba notícias atualizadas

  (CLIQUE AQUI)

“Ao comentar você declara ter ciência dos termos de uso de dados e privacidade
do Portal e assume integralmente a responsabilidade pelo teor do
comentário. “

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *