O acordo privado da moratória da soja, criado em 2006, tem impedido que 260 propriedades vendam soja em dois municípios de Mato Grosso. A medida vem sendo criticada nos últimos anos pelo setor produtivo e o seu fim vem sendo solicitado, inclusive, por lideranças políticas do estado.
A moratória da soja proíbe a compra de soja produzida em áreas do bioma Amazônia que tenham sido desmatadas após julho de 2008. A medida foi criada Associação Brasileira das Indústrias de Óleos Vegetais (Abiove) e Associação Nacional dos Exportadores de Cereais (Anec).
O assunto que de lá para cá vem sendo questionado pelo setor produtivo é o tema do episódio 115 do Patrulheiro Agro.
Em Vera e Feliz Natal, médio-norte de Mato Grosso, 70% dos agricultores estão impedidos de comercializar a oleaginosa com as empresas signatárias da moratória da soja. O governador de Mato Grosso, Mauro Mendes, criticou recentemente a restrição, que também penaliza produtores que abriram áreas cumprindo todas as exigências impostas pela legislação brasileira. Parlamentares, prefeitos e lideranças do setor produtivo também têm reforçado os impactos provocados pela moratória e cobrado o fim do acordo.
Desde 1979 a família da agricultora Gisele Turquino possui uma área de 5,6 mil hectares no município de Feliz Natal, onde cultiva soja e milho. Em 2008 ela assumiu a propriedade e administra a área que foi incluída na moratória a partir de 2018.
“O meu pai sempre prezou pela legalidade, ele sempre procurou fazer tudo dentro da lei. Sempre foi um produtor sério e uma das coisas que ele sempre fez foi pedir as licenças ambientais. Faltava ainda uns 12% para chegar nos 20% que seria o nosso quantitativo dentro da legalidade, quando nós finalizamos o nosso desmate em 2018, tudo dentro da legalidade com as licenças, com os pagamentos das medidas mitigadoras, nós nos deparamos com a moratória da soja”.
Conforme a produtora, o temor é que no próximo ano não consigam comercializar a soja. “Aí a renda do meu pai, que é a única renda que ele tem, fica comprometida”.
Moratória da soja é um crime imputado
De acordo com o presidente do Sindicato Rural de Vera e Feliz Natal, Rafael Bilibio, a moratória da soja “é um crime imputado ao produtor rural que faz as coisas dentro da legalidade, sem ser julgado, sem ser autuado ambientalmente e quando ele vê, está em uma lista e ele está fora do mercado. Ninguém pode comprar mais produto dele, não compra soja. Empresas não estão comprando milho por causa disso, carne. São 260 produtores entre Vera e Feliz que têm o nome na lista da moratória da soja”.
O assunto foi pauta de uma audiência pública realizada na Assembleia Legislativa de Mato Grosso (ALMT) recentemente. Durante o debate, deputados estaduais, prefeitos, produtores rurais e representantes do setor produtivo se juntaram para pedir o fim da moratória da soja.
Conforme o presidente da Aprosoja Brasil, Antônio Galvan, a medida trará problemas para dentro dos municípios, uma vez que propriedades começarão a ser embargadas pelo pacto estabelecido pelas tradings e processadoras.
“Embargar por um boicote com a Abiove e com a Anec, que são as empresas hoje que nos compra e nos exporta, juntamente com compradores europeus, para nos impedir o crescimento econômico. Então, você vê que a aberração é muito grande da forma que eles estão fazendo”.
Vice-presidente da Associação dos Produtores de Soja e Milho de Mato Grosso (Aprosoja-MT), Lucas Costa Beber, salienta que a moratória “interfere diretamente no direito à propriedade”.
“Sem dúvida nenhuma tira a renda de muito produtor, que deixa de expandir novas áreas trazendo desenvolvimento para o estado. Ou seja, interfere não só no dinheiro do produtor, no bolso do produtor, mas também da sociedade. Deixa de gerar divisas, gerar arrecadação e ainda obriga muitas vezes o produtor a comercializar para empresas de segunda linha, que muitas vezes somem com o dinheiro do produtor ou até mesmo não recolhe impostos, como o Fethab, deixando um buraco dentro do estado”.
Abuso de poder econômico, diz Mauro Mendes
O governador de Mato Grosso, Mauro Mendes, salienta que o rigor da lei deve ser aplicado para quem desmatou ilegalmente.
“Aliás, eu tenho defendido o perdimento, algo mais duro do que aquilo que se estabelece, se o Congresso Nacional tiver coragem de mudar a Constituição”.
Segundo Mauro Mendes, em uma reunião realizada no dia 21 de novembro em Cuiabá, “nessa reunião nós definimos que vamos agir politicamente, levando isso ao conhecimento do Congresso Nacional. É um desrespeito e uma afronta a lei. Vamos acionar juridicamente, porque também é um abuso de poder econômico e vamos estudar medidas de sanção econômica caso essa situação persista dentro do estado do Mato Grosso contra essas empresas”.
Para o presidente da Aprosoja Brasil, Antônio Galvan, o envolvimento da classe política mato-grossense e nacional no assunto é de importância.
“Isso já está dentro do Congresso Nacional. Com certeza, acredito que isso vai chegar a um consenso e vai se chegar a uma harmonia e vai se suspender essa moratória”.
Outro lado
A produção entrou em contato com o presidente da Associação Brasileira das Indústrias de Óleos Vegetais (Abiove), André Nassar. Ele informou que a Abiove não se manifestará publicamente sobre o assunto, mas reforçou que a entidade permanece aberta ao diálogo tanto com os agricultores quanto com o Governo de Mato Grosso.