GILBERTO GOMES DA SILVA
Na última semana, o Supremo Tribunal Federal (STF) considerou inconstitucional a tese do marco temporal na demarcação de terras indígenas no Brasil, gerando mais um capítulo nessa discussão sobre o tema, que tem sido debatido exaustivamente nos últimos meses.
Em maio deste ano, a Câmara dos Deputados aprovou o Projeto de Lei 490/2007, que trata do marco temporal, estabelecendo a data de promulgação da Constituição Federal, 5 de outubro de 1988, como base para que uma área seja considerada terra indígena.
Desde então, o PL está no Senado Federal tramitando com o número 2.903/2023. Nesta semana, a Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da casa começou a discuti-lo, mas houve pedido de vista, o que adiou a votação.
Mesmo com a decisão do STF, o Congresso Nacional pode dar continuidade à discussão do referido projeto de lei. Caso seja aprovado, vai para sanção do Presidente da República e, se sancionado, um novo capítulo se abre entre os Poderes da União.
Pelo projeto, que prevê regras gerais sobre o tema, somente poderão ser demarcadas as áreas que ficarem comprovadas as ocupações indígenas até a data de promulgação da CF, afetando, inclusive, os processos de demarcação já em andamento.
O texto do PL, apresentado em 2007 pelo ex-deputado por Mato Grosso, Homero Pereira, falecido em 2013, estabelece, ainda, que além de habitadas em caráter permanente pelas etnias, deve ser comprovado que as áreas eram necessárias para a reprodução física e cultural dos indígenas e para a preservação dos recursos ambientais necessários ao seu bem-estar.
A exceção se aplica somente se houver “renitente esbulho”, uma disputa judicial pela posse da terra na data especificada. Portanto, as áreas que não eram ocupadas por indígenas e não possuíam nenhum conflito na data do marco temporal, não poderão ser demarcadas.
Os ministros do STF ainda devem voltar ao caso na próxima quarta-feira (27), para a fixação da tese de julgamento, entre outros aspectos, como indenizações das áreas.
A questão é bastante complexa e envolve interesses desde produtores rurais até estados e municípios, causando insegurança jurídica em todo o país, mesmo porque seus efeitos indiretos já passam a existir, como por exemplo, medidas ambientais e econômicas restritivas a áreas, como suspensão de autorização de exploração, não emissão de documentos de regularidade ambiental, cancelamentos de linhas de custeio etc., isso sem falar na anulação de garantias reais anteriormente existentes sobre as áreas, e por aí seguem as adversidades.
A reflexão vai pautar a atuação dos parlamentares e, por certo, os dias que se avizinham serão bastante conturbados, pois, independente de razões ideológicas, históricas ou de convicções pessoais, a condição do Brasil, enquanto país de economia predominantemente primária, sob o aspecto econômico internacional, ficará em condição de estabilidade e risco na visão do investidor, especialmente o recém-criado FIAGRO, que tinha como perspectiva fomentar as atividades econômicas no campo.
Por hora, cabe-nos agir, no intuito de ver o Congresso Nacional exercer seu papel constitucional e pacificar a matéria de forma a materializar a real vontade do povo brasileiro.
GILBERTO GOMES DA SILVA – é advogado, especialista em Direito Civil e Processual Civil.
Os artigos assinados são de responsabilidade dos autores e não refletem necessariamente a opinião do site Cuiabá Notícias.