20 anos de visibilidade trans

ROSANA LEITE ANTUNES DE BARROS

No ano de 2004, mais precisamente no dia 29, ativistas transexuais, transgêneros e travestis se reuniram e lançaram no Brasil a primeira campanha contra a transfobia, dando origem à expressiva data. 

Denominada “Travesti e Respeito”, a campanha teve algumas parcerias, e foi abraçada pelo Ministério da Saúde e apresentada perante o Congresso Nacional. Transgêneros são pessoas que não se identificam com o sexo, na verdade gênero de nascimento. Travestis são pessoas que vivenciam o feminino, não se identificando com o masculino, mas se reconhecem em uma identidade feminina.

A campanha de dois séculos atrás foi organizada pela ANTRA (Associação Nacional de Travestis e Transexuais) e demais movimentos de ativistas que clamavam por respeito. O objetivo foi o de sensibilizar educadoras e educadores, os profissionais da saúde, e criar maior contato da sociedade para com o segmento, proporcionando a cidadania. A data tornou-se marco histórico para a visibilidade de pessoas, bem como pela luta por direitos da comunidade e denúncias de enfrentamento à transfobia.

Os dicionários nos ensinam que ser visível é estar aparente, conhecido, descoberto, escancarado, evidente, expresso, manifesto, patente, programado, e por aí afora. Assim, dar visibilidade é deixar legítimo o reconhecimento da importância, garantindo os direitos e reinvindicações, desmistificando informações e enfrentando a discriminação.

Apesar de tantas conversas francas sobre o tema, o esclarecimento é pequeno, as oportunidades ínfimas, as leis inexistentes, e o carisma escasso. Denúncias surgem cotidianamente na Defensoria Pública, mostrando que a violência e a discriminação colocam pessoas da comunidade em frequente risco de violação de direitos e da respectiva vida. É na família que, muitas vezes, a pessoa trans encontra o seu primeiro empecilho. A vulnerabilidade socioeconômica, a falta de qualificação e oportunidade, e a evasão escolar acabam por marcar entraves, apresentando a eles e elas, por vezes, a prostituição como o primeiro meio de subsistência. Estatísticas da Rede Trans apresentam que aproximadamente 82% das mulheres transexuais e travestis abandonam o ensino médio entre os 14 e 18 anos.

Ocupamos, brasileiros e brasileiras, o vergonhoso ranking, há mais de uma década, como o país que mais assassina a comunidade trans. Contamos com o Poder Judiciário na atualidade a “legislar” atipicamente, para ofertar o mínimo de dignidade. Se a transfobia, na atualidade é tratada como crime similar ao racismo, foi por decisão do Supremo Tribunal Federal. A facilidade em mudança de nome e gênero trans se deve ao Conselho Nacional de Justiça. É de se ressaltar que a Justiça Federal determinou ao IBGE a inclusão no questionário do Censo Demográfico de 2022, perguntas sobre orientação sexual e identidade de gênero. Por falta de pessoal qualificado para a abordagem, ainda não foi possível a pesquisa ser construída neste sentido.

Passados vinte anos da primeira campanha, o que há para o momento? Certamente, a dificuldade de construção de políticas públicas e ações afirmativas voltadas para pessoas. A Dignidade da Pessoa Humana, princípio ínsito na Constituição Federal, esta a “gritar” por socorro. 

Lá em 2004 os cartazes diziam: “Travesti e respeito: já está na hora de os dois serem vistos juntos. Em casa. Na boate. Na escola. No trabalho. Na vida.” Na atualidade, por certo, não houveram mudanças no clamor, em uma sociedade que teima em adotar padrões ásperos de binarismo de gênero.

Oxalá, Lupita Amorim e Jéssica Moreira (Xica da Silva), a sociedade possa reconhecer na humanidade, os seres humanos! 

       
ROSANA LEITE ANTUNES DE BARROS – é Defensora Pública Estadual.

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